domingo, 19 de novembro de 2006

O professor doutor

Manuel Machado. 41 anos. Treinador da Académica. Invejo-o. São vários os motivos.

Primeiro: tem um bigode farfalhudo. Algo que nunca poderei ambicionar ter, uma vez que a minha pelagem facial é muito pouco aguerrida, sobretudo no que concerne ao lábio superior. Além do mais, cá em casa sou violentamente criticado quando estou quatro dias sem encostar as lâminas de uma gilete à cútis.

Segundo: Tem sempre um bom sobretudo. Faça chuva, faça sol. Esteja frio ou calor. Esteja nevoeiro ou a cair aquela cacimba, Manuel Machado gosta de se sentir abrigado. O casaco dele também deve ter um bolso interior muito bom para guardar o telemóvel. Eu, por minha (sua) vez, tenho um casaco da Springfield que me custou vinte e nove euros e noventa cêntimos e não possui bolso interior.
Nota para a calma e tranquilidade que o sobretudo lhe garante. Necas possui nervos de aço, digno de um John Malkovich em "Conair", no papel de "Cyrus, The Vyrus". Acho que, mesmo fisicamente, denotam-se muitas semelhanças.

Terceiro: Mesmo não sendo negro, ostenta um excelente lábio inferior. Eu gostava de ter algo semelhante, que chegasse ao fim do copo de imperial. Ou se queimasse com a ponta de um cigarro acabado de acender. Ou gostava de poder meter o lábio dentro do meu local de trabalho, e vinte e dois segundos depois poder meter o resto do corpo. Manuel Machado consegue dar toques numa bola de futebol com o lábio.

Quarto: O ex-libris de Manuel "The Vyrus" Machado é o facto de ser o único técnico do mundo que tem dois diplomas: o de treinador de futebol e um mestrado em linguística clássica portuguesa. A troca da Choupana, na Madeira, por Coimbra, no último defeso, justifica-se com a necessidade de ter de conciliar os treinos da Académica com as aulas de Linguística Portuguesa VI, na Faculdade de Letras, e Direito das Coisas, na Faculdade de Direito. Note-se que, em conferência de imprensa por altura da saída da pérola do Atlântico, Manuel Machado disse: "Este fim anunciado tem a ver com situações de âmbito não desportivo, ou seja, com um conjunto de questões sociais e familiares." E acrescentou, com o lábio a termer, o que originou graves problemas de ondulação no porto de pesca funchalense: "É normal que uma região periférica que está afastada dos grandes centros de decisão sinta alguma discriminação e tenho acompanhado a questão do andebol feminino."

A prova da cultura gramatical e linguística de Manuel Machado está no sempre elaborado discurso durante conferências de imprensa, sobretudo nas análises aos jogos. Outra coisa que salta à vista, é a vontade de Manuel Machado querer sempre "pontuar" contra o adversário. Seja ele o Atlético do Cacém, o F.C. Porto, o Brøndby IF ou o Galatasaray.
Ora, note-se então alguns exemplos recolhidos, um pouco por toda a imprensa, que demonstram os dotes de linguística de Manuel Machado:

- "Um resultado que acaba por se aceitar, embora um conjunto de imponderáveis mereçam observação: Jogámos no Dragão com o líder da classificação e campeão em título de forma aberta, com uma estratégia que não pressupunha uma filosofia muito defensiva";
- "Alguns hiatos de concentração permitiram que o adversário fizesse dois golos";
- "Há assimetrias no futebol nacional que ficam bem patentes nestes momentos";
- "Na segunda metade, deu-se, efectivamente, um decalage em termos de qualidade" (note-se o uso da licenciatura em Literatura Francesa, tirada na Sorbonne em 1982);
- "Temos flutuado entre dois sistemas, o 4x4x2 e 4x2x3x1";
- "Souberam fazer um aproveitamento inteligente das nossas insuficiências";
- "A partir da próxima semana é que vou debruçar-me sobre as duas ou três vias passivas de aceitação em termos de projectos futuros" (Antes de abandonar o Nacional);
- "O jogo teve dois blocos diferentes";
- "É um jogo com análise pacífica, porque o 3-0 não deixa grande margem para leituras diversas";
- "O elemento fundamental que emerge desta partida é o reencontro com os três pontos";
- "A modalidade saiu beneficiada. Houve muito futebol no último terço do terreno";

Estava aqui a noite toda. Faltou-me, porém, a citação em que o professor utilizou o termo "superavit". Ficam os meus lamentos.

BM

1 comentário:

Anónimo disse...

fantástico post